Ex-prefeito sequestrado é libertado em Simões Filho

Quadrilha é presa dividindo meio milhão de dólares do resgate

Por Sérgio Ferreira 19/02/2018 - 23:06 hs

Existe um provérbio que diz que é preciso ter cuidado com as pessoas porque as aparências enganam. Na manhã desta segunda-feira (19), quatro homens entraram em fila no auditório da Polícia Civil, na Pituba. Um deles era um senhor, com poucos cabelos e muitas rugas. É difícil saber a idade de André (de camisa branca na foto abaixo) já que ele mesmo admite que tem 18 nomes falsos, pegou oito anos de cadeia e já foi preso por participação em outros crimes, além de ser suspeito de tomar conta de cativeiro onde estava o ex-prefeito de Valença, Ramiro José Campêlo de Queiroz,

Da esquerda para a direita: Carlos Eduardo, Márcio, André e Geraldo 

O grupo foi preso na quarta-feira (14) e é acusado pela polícia de participar do sequestro de Ramiro, ocorrido em janeiro deste ano. Ramiro, que também é fundador das lojas Guaibim, é conhecido na cidade por andar sem seguranças ou guarda-costas. Ele ficou 25 dias sequestrado.

Com a voz suave e ponderada, André Luís Maciel Santos contou que foi até Caçapava, cidade do interior de São Paulo onde o grupo foi preso, participar de um leilão de carros.

"Um amigo me chamou para acompanhar ele no leilão e como eu sei que ele participa sempre desses eventos, eu acompanhei. Não sabia do que estava acontecendo", contou o homem de muitos nomes.

André é natural de Minas Gerais, mas morou em diversos estados do país. Salvador é uma velha conhecida, já que ele passou oito anos por aqui na Penitenciária Lemos Brito, no Complexo Penitenciário da Mata Escura. Ele contou que foi condenado por receptação de produtos roubados e outros agravantes, mas não deu detalhes sobre os crimes.

Depois que deixou a cadeia, em 2015, André foi morar em São José dos Campos (SP), até que no ano passado mudou-se para o interior da Bahia. Segundo ele, o motivo da mudança foi o amor. "Conheci uma mulher, a gente se envolveu e fomos morar junto", disse. O endereço do novo casal ficava próximo ao mar, na praia de Guaibim, em Valença.

Segundo a Polícia Civil, André passará por exame de identificação criminal, no Departamento de Polícia Técnica (DPT) - pois já foi preso com 18 diferentes identidades e é preciso confirmar o nome dado por ele desta vez.

Sequestro
Para a polícia, os dois meses que durou a paixão de André serviram, na verdade, para estudar o sequestro. Segundo o delegado do Departamento de Repressão e Combate ao Crime Organizado (Draco), responsável pelas investigações, Cleandro Pimenta, a família da vítima não procurou a polícia para prestar queixa.

"Esse é o tipo de caso que independe de prestação de queixa, por isso, desde que o fato aconteceu as investigações foram iniciadas. Ainda não sabemos há quanto tempo a quadrilha estava atuando, mas todos os presos se conheceram na cadeia. Vamos ouvir a vítima nos próximos dias e isso pode ajudar a identificar outros suspeitos", contou.

O ex-prefeito Ramiro levantou da cama às 6h no dia em que foi sequestrado. Era uma quinta-feira e o empresário ainda estava em casa quando foi surpreendido por três homens armados, que renderam o ex-prefeito, sua esposa e um caseiro. Os bandidos arrastaram Ramiro até um carro Hyundai ix30, branco, que foi roubado alguns dias antes, na Avenida Paralela, em Salvador.

A vítima foi levada para o primeiro cativeiro, uma casa na zona rural de Valença. Alguns dias depois, Ramiro foi levado para outra residência, em Dias D'Ávila, na Região Metropolitana de Salvador, onde permaneceu até ser liberado. A polícia acredita que enquanto esteve preso, o ex-prefeito estava sob os cuidados de André, responsável por tomar conta da vítima nos dois cativeiros.

Liberdade
No dia 11 de fevereiro, portanto 25 dias após o sequestro, a família de Ramiro conseguiu reunir o dinheiro que os bandidos pediram e fizeram a entrega da quantia. O dinheiro, em espécie, foi entregue no município de Taubaté, no interior de São Paulo.

A polícia informou que André e outro comparsa foram os responsáveis por receber o valor. A quantia não foi divulgada, mas os investigadores estimam que o sequestro tenha custado para os Queiróz cerca de US$ 1 milhão.

No dia seguinte, pela manhã, o ex-prefeito foi liberado pelos bandidos em Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador. Ele pegou um táxi até a casa de um dos filhos dele, em Salvador, e seguiu para Valença, onde chegou por volta das 17h. Ramiro teve apenas uma fissura no braço, causada por uma queda que ele sofreu no cativeiro. Ele ainda será ouvido pela polícia.

André foi preso dois dias depois, quando almoçava em uma churrascaria no km 19 da Rodovia Presidente Dutra, em Caçapava (SP). Com ele estavam os baianos Márcio Reis dos Santos, o Bradock, 42, Geraldo Alves de Carvalho Neto, o Pastel, 36, e o pernambucano Carlos Eduardo Rabello, o Naja, 47. Os policiais encontraram com o grupo US$ 461 mil dólares em espécie, distribuídos em dois carros, um Honda Fit e um HB20. O dinheiro foi devolvido para a vítima.

Histórico
Apesar de ter nascido em Recife, Carlos morava no bairro da Caixa D'Água, em Salvador. Ele foi preso pela primeira vez aos 24 anos, por receptação de veículo, em Recife. Três anos depois, na mesma cidade, foi preso novamente por assalto a carro-forte e passou três anos na prisão.

Em 2001, no mesmo ano em que deixou a cadeia, foi preso de novo, no Maranhão. Carlos Eduardo estava com um grupo procurado por roubo a banco e passou um ano e cinco meses na prisão. Em 2005, acabou capturado na Bahia, depois de participar do assalto ao Banco do Brasil de Guanambi. Ele ficou na cadeia até agosto de 2017.

Já Márcio morava em Cajazeiras. Passou 13 anos preso depois de participar do assalto ao Banco Bandeirantes, na Feira de São Joaquim, e do Itaú, em Porto Seco Pirajá, ambos em Salvador, em 1998. A polícia também investiga a atuação dele em roubo a carros e outros crimes.

Geraldo morava em Lauro de Freitas, na RMS. Em abril de 2014 ele foi preso em Simões Filho acusado de participar de uma saidinha bancária. Três anos e 20 dias depois ele conseguiu o direito de passar para o regime semiaberto, mas não retornou mais para a cadeia e, por isso, era considerado foragido.

André, Carlos Eduardo, Márcio e Geraldo serão indiciados por extorsão mediante sequestro, e estão custodiados na carceragem do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). A polícia não descarta a participação de outras pessoas no crime, e ainda não identificou qual o líder da quadrilha.

Nesta segunda, Márcio deu uma pista. Segundo ele, um homem chamado Luciano, morador do Rio de Janeiro, teria ajudado no sequestro. Quando questionado sobre a participação dele no crime, o preso preferiu o silêncio.